ARTE LITERÁRIA - Fique por dentro!

As entrelinhas do texto literário. Nas entrelinhas do texto literário se encontra o não dito. Você se considera hábil a interpretá-las? 

“Ler nas entrelinhas”... tal assertiva relaciona-se de forma significativa com o universo literário. Sim, pois compreender a Literatura é, antes de tudo, entregar-se à reflexão. Dessa forma, desejamos perguntar a você, prezado (a) usuário (a):

Diante da leitura de um poema, ou até mesmo de um conto, ou qualquer outra modalidade narrativa (escrita em prosa), você o concebe como um simples emaranhado de palavras, cujo sentido para você ainda é obscuro, ou você consegue “captar”, digamos assim, o que o autor deseja lhe transmitir? Para que você possa dar vazão às suas ideias, ora firmadas, você precisa partir do princípio de que a arte literária é a arte da palavra. Assim, cada autor, vivendo em meio a uma realidade histórica, faz da expressão verbal o seu modo de ver e sentir aquilo que o rodeia. Por isso, muitas vezes, a depender da intenção de quem escreve, a literatura atua como verdadeiro instrumento de denúncia, sem dúvida. Contudo, você, enquanto leitor, precisa estar apto a desvendar o “indizível”, “o não dito”, quase sempre camuflado por entre as palavras notadamente explícitas. Como desenvolver tal habilidade?

Veja alguns exemplos, de modo a entender melhor essa questão:

[...]
Frequentemente surgiam brigas, e seus estremecimentos repercutiam longe, derrubavam paredes distantes e causavam novas brigas, até que os empurrões, chifradas, ancadas forçassem uma arrumação temporária. O boi que perdesse o equilíbrio e ajoelhasse nesses embates não conseguia mais se levantar, os outros o pisavam até matar, um de menos que fosse já folgava um pouco o aperto – mas só enquanto os empurrões vindos de longe não restabelecessem a angústia. [...]
(Trecho extraído do livro “A hora dos ruminantes”, de José J. Veiga) 

O trecho acima trata-se de uma narrativa fantástica, na qual os personagens são representados por animais, cuja manifestação se encontra relacionada ao contexto histórico demarcado pela época ditatorial. Como sabemos, a censura atuava como meio de represália àqueles que ousassem se posicionar de forma contrária aos mandos impostos à sociedade – razão pela qual muita gente foi exilada, desaparecida, enfim, punida. Assim, como entender a mensagem expressa pelo autor, se isso não se encontra explícito em lugar algum da narrativa? Eis o porquê da importância do conhecimento de mundo, e, em especial, do contexto que tanto norteou a história do povo brasileiro.

Outro exemplo, agora sob o estilo poético:

O bicho

Vi ontem um bicho
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos.

Quando achava alguma coisa,
Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.

O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato.

O bicho, meu Deus, era um homem.

(Manuel Bandeira)

Como interpretar as palavras desse nobre poeta se não temos conhecimento das ideias que tanto demarcaram os representantes modernistas? Saiba que uma delas foi a denúncia social. Dessa forma, contradizendo o que tanto cultuavam os representantes da era romântica, parnasiana e simbolista, os modernista chegaram para mostrar a “cara” do Brasil.

Assim, imprime-se nas palavras de Manuel Bandeira um verdadeiro espírito de indignação frente ao contexto político da era em questão.

Perguntamos: mediante uma leitura superficial da criação que nos serviu de exemplo, você conseguiu decifrar o que realmente quis dizer o autor?

Se sim, você realmente se mostra hábil a ler nas entrelinhas do texto literário.

Literatura – A arte da palavra. Fonte de toda capacidade criativa do artista! 

Os poemas

Os poemas são pássaros que chegam
não se sabe de onde e pousam
no livro que lês.
Quando fechas o livro, eles alçam vôo
como de um alçapão.
Eles não têm pouso
nem porto
alimentam-se um instante em cada par de mãos
e partem.
E olhas, então, essas tuas mãos vazias,
no maravilhoso espanto de saberes
que o alimento deles já estava em ti...

QUINTANA, Mário. Esconderijos do tempo. Porto Alegre: L&PM, 1980.

Logo no início do texto, deparamo-nos com o aposto, o qual é retratado pelos seguintes dizeres: A arte da palavra. Tal ocorrência infere-se à característica que a diverge das demais artes, na qual o “fazer literário” tem como essência pura, matéria que o compõe – A linguagem.

Essa linguagem que, ornamentada pela capacidade imaginativa, pela criação intrínseca ao artista, perpassa por inúmeras gerações, onde muitas vezes pelo seu caráter ficcional e subjetivo, retrata a mais autêntica figuração de uma realidade que nos cerca.

Difere-se dos demais textos em virtude do evidente emprego da função poética da linguagem, onde o emissor, por meio de toda sua subjetividade, centra-se na própria palavra, combinando e recombinando os signos linguísticos, dando-lhes uma “nova roupagem” de modo a atingir o objetivo artístico, o qual se propõe.

Didaticamente, podemos classificá-la como a disciplina que estuda os movimentos literários, os quais são representados por um grupo de artistas e obras, pertencentes a uma determinada época. Sendo que esta época refere-se a um determinado período histórico, abrangendo cultura e sociedade como um todo, refletindo, assim, na corrente ideológica das produções artísticas em voga.

Em função desta periodicidade, tais movimentos classificam-se como escolas literárias, cada uma representando as tendências estético-temáticas referente à vigência histórica na qual se figuravam. Assim, temos como exemplo o Classicismo, Barroco, Arcadismo, Romantismo, Realismo-Naturalismo, Parnasianismo, Simbolismo, Modernismo, desencadeando assim nas chamadas “tendências contemporâneas”.

Literatura: uma arte plurissignificativa. A Literatura como uma arte plurissignificativa? 

Talvez afirmarmos sobre o fato de que a literatura se concebe como uma arte plurissignificativa torna-se vago, impreciso. Todavia, ao nos depararmos com o poema que se apresenta expresso abaixo, pode ser que adquiramos uma visão mais ampla acerca do fato. Ei-lo, portanto:

Procura da poesia

Não faças versos sobre acontecimentos.
Não há criação nem morte perante a poesia.
Diante dela, a vida é um sol estático,
não aquece nem ilumina.
As afinidades, os aniversários, os incidentes pessoais não contam.
Não faças poesia com o corpo,
esse excelente, completo e confortável corpo, tão infenso à efusão lírica.

Tua gota de bile, tua careta de gozo ou de dor no escuro
são indiferentes.
Nem me reveles teus sentimentos,
que se prevalecem do equívoco e tentam a longa viagem.
O que pensas e sentes, isso ainda não é poesia.

Não cantes tua cidade, deixa-a em paz.
O canto não é o movimento das máquinas nem o segredo das casas.
Não é música ouvida de passagem, rumor do mar nas ruas junto à linha de espuma.

O canto não é a natureza
nem os homens em sociedade.
Para ele, chuva e noite, fadiga e esperança nada significam.
A poesia (não tires poesia das coisas)
elide sujeito e objeto.

Não dramatizes, não invoques,
não indagues. Não percas tempo em mentir.
Não te aborreças.
Teu iate de marfim, teu sapato de diamante,
vossas mazurcas e abusões, vossos esqueletos de família
desaparecem na curva do tempo, é algo imprestável.

Não recomponhas
tua sepultada e merencória infância.
Não osciles entre o espelho e a
memória em dissipação.
Que se dissipou, não era poesia.
Que se partiu, cristal não era.

Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário.
Convive com teus poemas, antes de escrevê-los.
Tem paciência se obscuros. Calma, se te provocam.
Espera que cada um se realize e consume
com seu poder de palavra
e seu poder de silêncio.
Não forces o poema a desprender-se do limbo.
Não colhas no chão o poema que se perdeu.
Não adules o poema. Aceita-o
como ele aceitará sua forma definitiva e concentrada
no espaço.

Chega mais perto e contempla as palavras.
Cada uma
tem mil faces secretas sob a face neutra
e te pergunta, sem interesse pela resposta,
pobre ou terrível, que lhe deres:
Trouxeste a chave?

Repara:
ermas de melodia e conceito
elas se refugiaram na noite, as palavras.
Ainda úmidas e impregnadas de sono,
rolam num rio difícil e se transformam em desprezo.

(Carlos Drummond de Andrade)

Como expresso no próprio poema, “Chega mais perto e contempla as palavras. / Cada uma / tem mil faces secretas sob a face neutra[...]”,se as palavras não dispusessem dessa face neutra, de que fala Carlos Drummond, talvez a Literatura não pudesse ser considerada uma arte, quem sabe... Contudo, se você ainda não conseguiu identificar essas mil faces (ainda que pareça hiperbólico demais para você) é porque ainda não descobriu o verdadeiro sentido da arte, da arte da palavra propriamente dita.

Indo mais além, sobretudo quando nos sentimos elevados diante dessa magnitude que subsidia nossa discussão, deparamo-nos com outros versos, ora demarcados por:

Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário.

Os poemas se encontram “em estado de dicionário”, como bem nos aponta esse grande mestre, mas espere: eles assim permanecem porque esperam ser escritos, haja vista que quando transportados ao papel, adquirem, assumem novas nuances. Assim, para reforçar ainda mais essa ideia que aqui se faz presente, acesse o texto “As entrelinhas do texto literário”.

Alguns aspectos que nele se sobressaem dizem respeito ao fato de que nem tudo num texto dessa natureza se encontra explicitamente identificável – e é justamente nessa questão que reside o ponto central das abordagens aqui demarcadas, ou seja, o que se encontra por trás do visível é o que confere esse caráter plurissignificativo, essa amplitude de interpretações. Eis que daí fazemos menção ao “estado de dicionário”, ou seja, estado esse referente ao sentido convencional, denotativo das palavras. Literatura? Temos certeza de que não é, pois a arte literária não deve ser assim tão breve, concisa, assim como é o sentido das palavras retratadas por meio dos verbetes enciclopédicos. Ao contrário, ela deve se conceber como efêmera, como objeto subjetivo, como produto passível de múltiplas interpretações, de visões multifacetadas, haja vista que, quando do contrário, as entrelinhas, o descortinar das palavras se tornam impalpáveis, invisíveis aos olhos.

Poema:Fruto de um manuseio, de todo um trabalho especial com as palavras: o poema, por excelência! 

Os poemas

Os poemas são pássaros que chegam
não se sabe de onde e pousam
no livro que lês.
Quando fechaso livro, eles alçam voo
como de um alçapão.
Eles não têm pouso
nem porto
alimentam-se um instante em cada par de mãos
e partem.
E olhas, então, essas tuas mãos vazias,
no maravilhoso espanto de saberes
que o alimento deles já estava em ti...

(Mário Quintana)

Ao nos situarmos diante de tal criação, a definição de poema- alvo de nossa discussão- parece se perder em meio à grandiosidade e eloquência das palavras, em meio ao sentido simbólico que elas representam. Ora, simplesmente porque o poema, literalmente retratado na criação, caracteriza-se pela ideia expressa por Mário Quintana, ou seja, ele, utilizando-se de uma linguagem metafórica, descreve acerca dos pressupostos que norteiam a linguagem poética propriamente dita, como em:

Os poemas são pássaros que chegam
não se sabe de onde e pousam
no livro que lês.
Quando fechaso livro, eles alçam voo

[...]

Ao comparar os poemas com os pássaros, sobretudo porque eles simbolizam a liberdade, atingem grandes alturas, enfim, de forma simbólica, o poeta faz alusão à capacidade imaginativa, à habilidade de criação advinda de quem se propõe ao trabalho de ourivesaria com as palavras¸ com a linguagem de uma forma geral. Em outro verso, Mário nos revela que:

Quando fechas o livro, eles alçam voo
como de um alçapão.
Eles não tem pouso
nem porto
alimentam-se um instante em cada par de mãos
e partem.

Tais versos atestam que esse manuseio, por vezes, não se define como algo fácil, ao contrário, como os pássaros, a imaginação, o poder de criação pode alçar voo e se tornarem inatingíveis, não palpáveis. Daí a razão de se alimentarem em cada par de mãos, embora tão logo partam, pois a fruição para a escrita pode ser algo fugaz, por isso a importância de darmos vazão aos sentimentos e deixar que eles falem por nós mesmos.

Posicionamentos como esses elucidam acerca do caráter subjetivo que permeia a linguagem poética, a linguagem literária de uma forma geral. Contudo, em se tratando dos aspectos estruturais, um poema, ao ser comparado com outras modalidades de texto, diverge-se pelo fato de não ser construído em forma de prosa, mas sim em forma de verso (afirmamos ser essa uma das particularidades básicas). Prosseguindo com as demais características, temos que, a começar pela finalidade discursiva, pela função que se atribui à linguagem poética, nela prevalece (como não poderia deixar de ser) o sentido conotativo, aquele voltado para a multiplicidade de interpretações, para a subjetividade, acima de tudo. 

Se a modalidade em questão se define, como antes dito, pelo trabalho especial com a linguagem, não era de se estranhar que o emprego de determinados recursos tendem a incrementar, a dar maior vivacidade ao que se pretende dizer. Assim, outros aspectos, também não menos importantes, revelam, digamos assim, sua parcela de contribuição, sendo que esses, por sua vez, dizem respeito à métrica, rima, além de outros recursos ligados à sonoridade, tais como a paronomásia, aliteração, paralelismo, assonância, entre outros. Acerca deles, os textos “Recursos da linguagem poética” e “Recursos sonoros do texto literário” trazem a você, em primeira mão, importantes elucidações que poderão complementar ainda mais as noções aqui expostas, aprimorando de forma efetiva o seu aprendizado.

Recursos sonoros do texto literário:Dado o caráter plurissignificativo do texto literário, recursos sonoros são os que não faltam.

Antes mesmo de adentrarmos o assunto que demarca esse nosso encontro, o próprio título parece nos antecipar pistas que nos levam a manifestar algumas noções previamente elencadas. Nele há um termo que abarca todos os pressupostos relevantes à temática em questão, o qual se define pelo vocábulo “recursos”.

Nesse sentido, em se tratando da linguagem literária, distintos são eles, visto que tal diversidade se aplica em virtude do caráter que se atribui à modalidade ora em evidência, ou seja, a plurissignificação. Assim, tendo em vista as intenções que o emissor (no caso, o artista de uma forma geral) pretende, almeja alcançar com o discurso que produz. No caso dos poemas, especificamente falando, torna-se ilimitado o uso de tais recursos que, em termos de materialidade poética, manifestam-se pelas figuras de linguagem, que nada mais são que todos os ornamentos que são aplicados ao trabalho com a própria palavra, cujo sentido é o de conferir ênfase a ela mesma.

Dessa forma, entre os muitos recursos, encontram-se aqueles voltados para o aspecto sonoro, os quais, quando bem utilizados, trabalham tão somente em prol da musicalidade, rimas, métrica e do ritmo propriamente dito. Entre eles, cabe-nos ressaltar acerca de alguns:

Assonância

Tal recurso define-se pela repetição de um mesmo fonema vocálico, como o que se manifesta nos versos de Manuel Bandeira, cuja criação tem como título A onda:

A onda
a onda anda
aonde anda
a onda?
a onda ainda
ainda onda
ainda anda
aonde?
aonde?
a onda a onda

A começar pela estética de tal criação, notamos que se trata de um poema bem ao gosto concreto - ainda que modernista-, justamente para enfatizar a forma com “a onda” se manifesta, ou seja, indo e vindo. Em se tratando dos recursos sonoros, há de constatar que por repetidas vezes os fonemas /a/ e /õ/ = (on), cujo intuito também não se destoa do efeito de sentido atribuído ao autor mediante o discurso em questão, isto é, simbolizar o próprio ritmo das ondas.

Aliteração

Trata-se, também, de uma repetição, mas desta vez com o fonema consonantal, como o que amplamente identificamos por meio dos versos de Manuel Bandeira, inerentes ao poema:

Canção do Vento e da Minha Vida

O vento varria as folhas,
O vento varria os frutos,
O vento varria as flores...
E a minha vida ficava
Cada vez mais cheia
De frutos, de flores, de folhas.

O vento varria as luzes
O vento varria as músicas,
O vento varria os aromas...
E a minha vida ficava
Cada vez mais cheia
De aromas, de estrelas, de cânticos.

O vento varria os sonhos
E varria as amizades...
O vento varria as mulheres...
E minha vida ficava
Cada vez mais cheia
De afetos e de mulheres.

O vento varria os meses
E varria os teus sorrisos...
O vento varria tudo!
E minha vida ficava
Cada vez mais cheia
De tudo.

Inferências atestam que repetição do fonema /v/ corrobora para criar o efeito de sentido a que se propôs o poeta, ora demarcado pelo ato de varrer, tão simbólico que chega ao ponto de desenharmos em nossa mente a imagem da vassoura passeando por um canto e outro e levando consigo, “capturando” a sujeira depositada num canto qualquer.

Paronomásia

O posicionamento por tal figura consiste em aproximar palavras que se assemelham em virtude do som que produzem, mas que, no entanto, distinguem-se quanto ao significado que representam. Ilustrando-a, retomaremos o poema A onda, cujas manifestações assim se manifestam:

a onda anda
aonde anda
a onda?
a onda ainda
ainda onda
ainda anda
aonde?
aonde?
a onda a onda

Temos que as palavras onda, anda, aonde e ainda, ainda que semelhantes em termos sonoros, constituem-se de significados distintos.

Romance Policial:Desvende este mistério! Saiba mais sobre o Romance Policial brasileiro.

Você sabia que o Romance Policial é um dos gêneros mais populares – e vendidos – do mundo? Com enredos que giram em torno de assassinatos, investigações, depoimentos de testemunhas e descobertas de criminosos, no Brasil, a literatura do mistério também tem seus representantes.

A história do romance policial começou em 1841 com a publicação em uma revista do conto “Os assassinatos da rua Morgue”, do escritor norte-americano Edgar Allan Poe. No Brasil, apesar de não termos tradição literária quando o assunto é o gênero policialesco, a primeira narrativa policial foi publicada em capítulos no jornal “A Folha”, em 1920: “O mistério”, escrito por Coelho Neto, Afrânio Peixoto, Medeiros e Albuquerque e Viriato Corrêa. Desde então, outros autores arriscaram-se no gênero que já contava com prestígio e tradição em outros países, mas que, infelizmente, em nosso país, ainda é visto como um subproduto da literatura, ou seja, uma subliteratura.

Isso porque se acredita que seja difícil escrever uma narrativa de suspense que preserve os elementos necessários para a construção de uma boa trama, tais quais o cuidado com a linguagem, o texto e as personagens. Contudo, autores como Rubem Fonseca, Marçal Aquino - que desde os anos 70 dedicam-se com afinco ao romance policial -, Luiz Alfredo Garcia-Roza, Joaquim Nogueira, Tony Bellotto, Luis Fernando Veríssimo, Flávio Carneiro, Patrícia Melo, Jô Soares, entre outros nomes, começaram a definir os rumos do romance policial no Brasil, deixando-o mais forte como gênero e divulgando-o em diversos eventos literários relevantes para a Literatura nacional.

Texto literário e não literário - marcas linguísticas. Interaja-se mais com as particularidades que os norteiam!

Antes de partirmos, de modo enfático, para as características que delineiam ambas as modalidades, faremos uma breve consideração no tocante aos aspectos primordiais que perfazem o texto, vistos de maneira abrangente. 

Toda e qualquer produção escrita é fruto de um conjunto de fatores, os quais se encontram interligados e se tornam indissociáveis, de modo a permitir que o discurso se materialize de forma plausível. Portanto, infere-se que tais fatores se ligam aos conhecimentos de quem o produz, sejam esses de ordem linguística ou aqueles adquiridos ao longo da trajetória cotidiana. 
Aliada a essa prerrogativa existe aquela que inegavelmente norteia a concepção de linguagem, ou seja, a de possuir um caráter dinâmico e estritamente social. Isso nos leva a crer que sempre estamos dialogando como o “outro”, e que, sobretudo, compartilhamos nossas ideias e opiniões com os diferentes interlocutores envolvidos no discurso. 

Essa noção, uma vez proferida, tende a subsidiar os nossos propósitos no que se refere ao assunto em questão. E, para tal, analisemos: 

Os poemas

Os poemas são pássaros que chegam
não se sabe de onde e pousam
no livro que lês. 
Quando fechas o livro, eles alçam voo 
como de um alçapão.
Eles não têm pouso
nem porto
alimentam-se um instante em cada par de mãos
e partem.
E olhas, então, essas tuas mãos vazias,
no maravilhoso espanto de saberes
que o alimento deles já estava em ti...

(QUINTANA, Mário. Esconderijos do tempo. Porto Alegre: L&PM, 1980.)

O exemplo em voga trata-se de uma criação poética pertencente a um renomado autor da era modernista. Atendo-nos às suas peculiaridades no tange à linguagem, notamos a presença de uma linguagem metafórica que simboliza a capacidade imaginativa do artista comparando-a com a liberdade conferida aos pássaros, uma vez que são livres e voam rumo ao horizonte. 

Por meio dos seguintes excertos poéticos, assim representados, voltamos à ideia anteriormente mencionada de que a competência linguística vai paulatinamente sendo “adornada”, de acordo com a troca de experiências entre o emissor e o mundo que o rodeia: 

Eles não tem pouso
nem porto
alimentam-se um instante em cada par de mãos
e partem.
E olhas, então, essas tuas mãos vazias,
no maravilhoso espanto de saberes [...] 

Desta feita, a intencionalidade discursiva, característica textual marcante, pauta-se por despertar no interlocutor sentimentos e emoções, com vistas a oferecer uma multiplicidade de interpretações, uma vez conferida pelo caráter subjetivo. Eis assim a característica que nutre um texto literário. 

Pensemos agora em um outro tipo de texto, no qual não identificamos nenhum envolvimento por parte do emissor, pois suas marcas linguísticas primam-se pela objetividade. A conclusão a que podemos chegar é que, nesse caso, a finalidade é apenas informar algo, tal qual se encontra no discurso apresentado, isento de marcas pessoais, opiniões, juízos de valor e, sobretudo, de traços ligados à subjetividade. 

Uma notícia, reportagem, artigo científico? Seriam esses os casos representativos? A reposta para tal indagação é reafirmá-la, uma vez que tais modalidades tem uma finalidade em comum: a informação. Essa, por sua vez, precisa retratar uma certa credibilidade conferida por meio do discurso. Daí o caráter objetivo, razão pela qual o autor, em momento algum, não deixa que suas opiniões se fruam em meio ao ato discursivo a que se propõe. Tal particularidade revela a natureza linguística do chamado texto não literário.

Versificação

A versificação ou metrificação é um recurso estilístico utilizado por muitos poetas, cuja existência não está necessariamente relacionada com a noção de poesia. Consiste na técnica de fazer versos, dedicando-se ao estudo dos metros, pés, acento e ritmo, além de estabelecer normas para a contagem das sílabas de um verso.

Grandes poetas, como Manuel Bandeira e Carlos Drummond de Andrade, não se dedicaram com muita frequência ao estudo da métrica, no entanto, não deixaram de ser grandes nomes da literatura brasileira. Muitos se dedicaram à versificação sem nunca terem sido considerados como nomes relevantes em nossa produção literária. Na literatura brasileira, Olavo Bilac e Guimarães Passos escreveram o Tratado de versificação, tendo Bilac ficado conhecido por defender ardorosamente a métrica, produzindo diversos poemas dedicados sobretudo aos elementos concernentes à versificação. Sendo assim, não é pertinente que a versificação seja confundida com poesia: esta é capaz de despertar encantamento estético e está intrinsecamente relacionada com o campo das sensações. Pode estar presente em diversas manifestações artísticas e até mesmo no cotidiano do homem. A versificação está para o poema, pois o poema refere-se à forma, ou seja, aos versos, estrofes e sua disposição.

O ritmo poético, noção elementar do conceito de versificação, tem como principal característica a repetição e é assegurado pela utilização dos seguintes elementos:

1) Número fixo de sílabas: difere em muito da contagem de sílabas proposta pela norma gramatical. Na recitação, o que é relevante é a realidade auditiva, e não a representação escrita da palavra;

2) distribuição das sílabas fortes (ou tônicas) e fracas (ou átonas);

3) cesura: pausa interna que pode ocorrer em virtude da necessidade de uma interrupção sintática ou pela necessidade de destacar algum vocábulo;

4) rima: igualdade ou semelhança de sons na terminação das palavras a partir da última vogal tônica. Pode ser classificada como perfeita, quando a identidade dos fonemas finais é completa, ou imperfeita, quando essa mesma identidade fonética não é completa;

5) aliteração: está relacionada com o desejo de harmonia imitativa, repetindo fonemas em palavras simetricamente dispostas. Observe a repetição do fonema /v/ no fragmento do poema “Violões que choram”, do poeta simbolista Cruz e Sousa:

“Vozes veladas, veludosas vozes,
Volúpias dos violões, vozes veladas,
Vagam nos velhos vórtices velozes
Dos ventos, vivas, vãs, vulcanizadas.”

6) encadeamento: repetição de fonemas, palavras, expressões ou um verso inteiro simetricamente disposta;

7) paralelismo: consiste na repetição simétrica das palavras dentro de seu conteúdo semântico, cuja principal intenção é tornar o texto mais elaborado e requintado. Observe a ocorrência do paralelismo no fragmento do poema “Baladas Românticas”, de Olavo Bilac:

Como era verde este caminho!
Que calmo o céu! que verde o mar!
E, entre festões, de ninho em ninho,
A Primavera a gorjear!...
Inda me exalta, como um vinho,
Esta fatal recordação!
Secou a flor, ficou o espinho...
Como me pesa a solidão!

Carlos Drummond de Andrade certa vez afirmou sua identificação e filiação ao movimento modernista brasileiro que ganhou voz sobretudo em São Paulo, no ano de 1922. Os poetas modernistas prezavam maior liberdade à criação poética e uma forte ruptura com o modelo literário vigente, o Parnasianismo. Contudo, já em sua maturidade como poeta, Drummond afirmou que a "liberdade que não é absoluta, pois a poesia pode prescindir da métrica regular e do apoio da rima, porém não pode fugir ao ritmo, essencial à sua natureza”.

“Lutar com palavras
é a luta mais vã.
Entanto lutamos
mal rompe a manhã.
São muitas, eu pouco.
Algumas, tão fortes
como o javali.
Não me julgo louco.
Se o fosse, teria
poder de encantá-las.
Mas lúcido e frio,
apareço e tento
apanhar algumas
para meu sustento
num dia de vida.
Deixam-se enlaçar,
tontas à carícia
e súbito fogem
e não há ameaça
e nem 3 há sevícia
que as traga de novo
ao centro da praça. (...)”

(Fragmento do poema “O lutador”, de Carlos Drummond de Andrade)

Verso, Estrofe e Rima - Noções conceituais
Mediante tal tríade, reportamo-nos a uma modalidade textual ora denominada de poética, estritamente inerente ao campo literário. Trata-se de características ligadas a questões de ordem estética, ou seja, a maneira pela qual o texto é disposto. 

Caso fôssemos analisar, esteticamente, um texto redigido em prosa, ainda no âmbito da Literatura, logo teríamos os parágrafos como referencial. Todos articulados de uma forma coesa e harmoniosa, com vistas a proporcionar uma perfeita interação entre o discurso proferido e o interlocutor com o qual se compartilha. Entretanto, no caso da modalidade em questão, o assunto apresentado é disposto em forma de um conjunto de versos, todos distribuídos conforme a finalidade discursiva pretendida pelo autor, denominado de estrofe. 

No tocante a fatores de ordem interna (essência discursiva), o texto escrito sob a forma prosaica tende a estabelecer uma certa linearidade na ideia apresentada, visto que se trata de uma trama ficcional onde os acontecimentos vão progressivamente se desenvolvendo. Diferentemente ocorre com a maioria dos poemas, pois o objetivo pauta-se pelo aflorar de sentimentos e emoções, todos regados a um instinto de total subjetividade. 

Mas não priorizaremos aqui somente tais características, posto que nosso objetivo é verificar a maneira como elas, de forma teórica, se conceituam. Pois é o que veremos adiante, de modo a nos envolver ainda mais nesse universo contagiante de magia e encantamento... Que de forma magistral é representado pela arte poética! Sendo assim, compartilhemos a obra de Vinícius de Moraes:

Soneto de Fidelidade

De tudo ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.

Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento

E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama

Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.

(Vinícius de Moraes, "Antologia Poética", Editora do Autor, Rio de Janeiro, 1960, pág. 96.)

Servimo-nos desse referencial para concretizarmos os objetivos propostos. 

A priori, detectamos que se trata de várias linhas poéticas, assim representadas:
De tudo ao meu amor serei atento/ Quero vivê-lo em cada vão momento/ E assim, quando mais tarde me procure [...]

Tais excertos poéticos denominam-se versos. 

Agora analisemos um conjunto no qual eles se encontram dispostos:

De tudo ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.

Aplicamos a ele o conceito de estrofe, visto que se trata de um conjunto de versos. 

E por fim vejamos que determinadas palavras, de modo específico, as últimas de cada verso, aparentam semelhança quanto à estrutura sonora:

Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento

Essa semelhança sonora denomina-se rimas. No exemplo acima, elas ainda recebem uma denominação própria de acordo com a maneira pela qual se encontram distribuídas, sendo chamadas de interpoladas. Podemos notar que rimam o seguintes pares de versos: 

Quero vivê-lo em cada vão momento /Ao seu pesar ou seu contentamento – 1º e 4º
E em seu louvor hei de espalhar meu canto / E rir meu riso e derramar meu pranto – 2º e 3º.

http://www.portugues.com.br/literatura/arte-literaria/


0 comentários:

Postar um comentário