Em homenagem ao Dia da Língua Portuguesa, minha crônica de hoje, Gato e Sapato, no jornal Notícias do Dia.
GATO E SAPATO
Hilton Görresen
Existem expressões usadas até hoje que nos parecem absurdas, nada têm a ver com seu sentido. É o caso da expressão “fazer de gato e sapato”, significando abusar de alguém. O que tem a ver gato com sapato, além da rima? Se alguém pesquisar a origem desse dito popular, descobrirá que, na verdade, uma versão provável é (ou era) “fazer de gato sob pata”. Aí sim, um perverso animal tem o gatinho sob suas patas e faz o diabo com ele. Preferia que fosse “fazer de rato sob pata”, que serviria de incentivo à exterminação desse desagradável roedor. Como a frase é meio erudita, o povão terminou por simplificá-la.
Outra expressão mal entendida é a famosa “colocar as barbas de molho”. Qual o objetivo disso? Aliás, atualmente poucos usam barba, a não ser os muçulmanos, sem falar nos integrantes do PT. Imaginem Bin Laden, quando vivo, passando a noite com a barba dentro de uma bacia de água. A não ser que ele saiba que o provável é “colocar as bragas de molho”. Bragas é como nossos irmãos portugueses denominam as calças. Desse modo, pode-se muito bem colocá-las de molho, prevenindo-se para algum acontecimento futuro.
As barbas de nossos ancestrais também motivaram outra expressão: “não se pescam trutas a barbas enxutas”. Isso quer dizer que para conseguir esse delicioso peixe deve-se mergulhar na água com barba e tudo? Não. Aí novamente tudo se esclarece se substituirmos barbas por bragas. Não se pescam trutas sem entrar na água e molhar as calças. Essa troca de sentidos poderia motivar a expressão “não se pode defecar sem arriar as barbas”.
O povo gosta de dizer “este menino é o avô cuspido e escarrado”. Tem-se a impressão de que o pobre menino nada mais é do que o excremento do avô. Alguns defendem que o termo original é “esculpido em Carrara”, fazendo menção ao famoso mármore de Carrara, na Itália, utilizado pelos grandes escultores. Nesse caso, tem-se que o neto foi “esculpido” de modo perfeito, tendo como modelo o avô. Não sou a favor dessa versão, acho muito elitizada. Outra variante de sentido é “esculpido e encarnado”. Esculpido e tornado carne, como se fosse produzido por um Pigmaleão, que deu vida a uma estátua. Mas como o povão ia saber disso?
Tornou-se moda corrigir o sentido de algumas velhas expressões, há muito tempo popularizadas. Mas algumas dessas correções, como “quem tem boca vaia Roma” são equivocadas. Por que alguém vaiaria Roma? Prefiro a sábia sentença, muito mais adequada: quem tem boca vai a Roma e a qualquer lugar do mundo.
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