URUPÊS –
MONTEIRO LOBATO
Quando Pedro I lança aos
ecos o seu grito histórico e o país desperta estrouvinhado à crise e uma mudança
de dono, o caboclo ergue-se, espia a acocora-se de novo.
Pelo 13 de maio, mal
esvoaçava o florido decreto da Princesa e o negro exausto larga num uf! o cabo
da enxada que do velho mundo venha que pegue nele de novo.
A 15 de novembro, troca-se
um trono vitalício pela cadeira quadrienal. O país bestifica-se ante o
inopinado da mudança. O caboclo não dá pela coisa.( ...)
Nada o desperta. Nenhuma
ferroada o põe de pé. Social, como individualmente, em todos os atos da vida,
Jeca antes de agir, acocora-se.
Jeca Tatu é um piraquara do
Paraíba, maravilhoso epítome de carne onde se resumem todas as características
da espécie.
Ei-lo que vem falar ao
patrão. Entrou, saudou. Seu primeiro movimento após prender entre os lábios a
palha de milho, sacar o rolete de fumo e disparar a cusparada d’esguicho, é
sentar- -se jeitosamente sobre os
calcanhares. Só então destrava a língua e a inteligência.
___ Não vê que ...
De pé ou sentado as ideias se
lhe entramam, a língua emperra e não há de dizer coisa com coisa.
De noite, na choça de palha,
acocora-se em frente ao fogo para “aquentá-lo”, imitado da mulher e da prole.
Para comer, negociar com
barganha, ingerir um café, tostar um cabo de foice, fazê-lo noutra posição será
desastre infalível. Há de ser de cócoras.
Nos mercados, para onde leva
a quitanda domingueira, é de cócoras como um faquir do Bramaputra, que vigia os
cachimbos de brejeúva ou de o feixe de três palmitos.
Pobre Jeca tatu! Como és
bonito no romance e feio na realidade!
Jeca mercador, Jeca
lavrador, Jeca filósofo ...
Lobato, Monteiro. “Urupês”.
22. Ed. São Paulo, Brasiliense, 1978. P. 147.
1 comentários:
Esse fragmento está dotado de erros ortográficos!
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