O drible curto da crônica
Brasigóis Brasigois Felicio

No dia 28 de agosto, os escritores Edival Lourenço, Hélio Moreira e este cronista fomos expositores de uma mesa-redonda em que se discutiu sobre se a crônica é ou não é parte da literatura como gênero. Um qualificado auditório participou ativamente do debate, em tarde-noite memorável, que fez parte evento anual da Academia Goiana de Letras em homenagem a seu fundador, Colemar Natal e Silva. Lembrei em minha fala de como tornei-me cronista levado pelas moendas do acaso ou agraciado pela sorte de ter sido convidado pelo então diretor do POPULAR, Domiciano de Faria, para cobrir as férias de Jean Pierre Conrad, apreciado cronista que dividia o espaço com Mário Moraes. Aceitei de pronto, estava ali, disponível, como poeta da casa – era então repórter do jornal, e atuava no então Caderno 2. Ao final das férias do Jean Pierre, ele ligou para o Domiciano pedindo que eu fosse mantido na função: “O menino é bom de serviço, é do ramo”, ele disse.

Domiciano topou o desafio de manter no cargo o então jovem de vastas madeixas e barbudo, crítico incendiário, xerife da literatura, só aqui publiquei mais de 2 mil crônicas, além de seis livros no gênero, dos quais dois premiados. Em certa ocasião, boa parte da AGL fazia-se presente neste espaço: Carmo Bernardes, Belkiss Spenciére, falecidos, e atualmente José Mendonça Teles, dando um tempo, Bariani Ortêncio, Edival Lourenço e Ursulino Leão.

Discutiu-se na mesa-redonda sobre o espaço da crônica, sua marginalidade insistente e estóica, sua presença na imprensa brasileira, em todos os tempos, como espaço da respiração do jornal, como penso que ela é: lugar ocupado por escritores e poetas, a partir de Humberto Campos, Machado de Assis, Olavo Bilac, e nos tempos mais atuais, com Rachel de Queiroz, David Nasser, Nelson Rodrigues, Paulo Mendes Campos, Fernando Sabino, e o mestre Rubem Braga. Até Clarice Lispector, para defender uns trocados, atacou de cronista, com seu estilo hermético e às vezes estranho.

Circulava entre os debatedores o livro O Espaço da Crítica II (Crônica: Dimensão Literária), da ensaísta e professora Moema de Castro e Silva Olival, a desmentir que seja a crônica primo pobre e desvalido da literatura, sem pai nem mãe, desnaturado, inválido. A obra haverá de ser referência no gênero, a lembrar a atualidade desde espaço conquistado sem esforço, na base da empatia emocional, sendo sabido que a crônica nunca é vista de gravata, ou em traje de festa de gala – sendo mais afeita a andar em bermudas, flanando pela vertigem das cidades, com ouvido atento, escutando a voz encantadora ou perigosa das ruas. Falei da responsabilidade que deve ter quem seja cronista, pois, tendo seguidores constantes, pode salvar e matar, com suas palavras.

Contei que certa vez, indo de ônibus para flanar e esquentar as partes, em Caldas Novas, encontrei no ônibus um rapaz que disse não ter cometido suicídio por ter lido uma crônica minha, publicada neste jornal. Porém, soube que em fase em que era pessimista, amargo e de mal com a vida, uma pessoa se matou depois de ter lido uma crônica da minha lavra. A sorte é que foi um caso isolado, e creio que com meu ofício de artesão do verbo tenho feito mais bem do que mal às pessoas.

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