Vai enxugar as lágrimas atrás do paiol, sentado sobre as pedras do pequeno córrego de águas cristalinas e borbulhantes. O riozinho sulca a terra vermelha e fértil. Vários patinhos brincam em seu leito sob os olhos atentos da pata. Sente uma imensa poesia dentro de si, mas não consegue transmitir. Expulso da sede, não conseguia ver o presépio. O pai sequer o reparara. A tarde avança. Outro caminhão entra no pátio para levar o restante dos trabalhadores. A poeira levantada pelo rodado paira no ar abafado. Camada fina de terra que arde na garganta. Há, nele, uma vontade incontrolável de espiar o presépio, quem sabe perguntar ao Menino Jesus se a caminha é quente, macia, se não machuca as costelinhas frágeis nos fiapos de vassoura seca... Em sua cabeça as palavras do padre de Jandaia:
__ Natal é tempo de amar ... Cada coração se enche de bondade e transborda. Só assim se pode perceber as graças do Menino ...
Mas ninguém lhe dá atenção. A vontade de amar e ser amado explode dentro do peito. Ele tem vontade de colher as flores no campo e distribuir entre os últimos camaradas suados.
Nesta noite, o Menino renasceria dentro do homem; cada homem se tornaria menino de orvalho novamente a correr pelas campinas verdes. No amanhecer, a pureza tomaria cada coração.
Natal! - o renascimento do homem. A alegria de viver estaria em cada rosto. Ela dançaria dentro de cada coração como o minuano dança nos telheiros de ricos e pobres. Em sua casa não haverá presépio. Mas o que importa? O Menino Jesus está no ar, dança alegre na tarde sobre a copada das árvores.
sai em disparada ao campo e colhe sempre-vivas e margaridas. Distribui aos trabalhadores suados. O pai balança a cabeça:
__ Este pirralho está bestando!
Então, ele pergunta com medo:
__ Deixa eu ir na Missa do Galo?
__ Ora, só: nem calças compridas veste!
Os camaradas riem.
__ Pra casa, já! Me deixe em paz!
O pai fala sério. Sente as lágrimas brotarem ali no meio dos homens. Com sacrifício, engole o nó na garganta. Desmancha-se num sorriso sem graça. Onde está o amor que o padre de Jandaia falara naquela missa de domingo? O gato comeu. Ele quer mostrar o quanto ama, mas as muralhas são intransponíveis. O pai nem o olha, acha-o muito pequeno. Sente inveja dos homens grandes. Mas ele haveria de crescer muito, ficar taludo, forte como um touro. Acordaria o sol nas madrugadas, amarraria os bois nos mangueiros, tiraria leite gordo das tetas da vaquinha Mimosa, montaria em burro brabo, dirigiria o trator da fazenda... Poderia ir aos bailes, beliscar as moças, dançar, jogar truco, embebedar-se ... Ah, como o tempo não passa!
Ele sabe que é tempo de ganhar presentes. O Papai Noel faz visitas no meio da noite, com um grande saco cheio de brinquedos e vai deixando em casa os pedidos dos meninos. O padre de Jandaia dissera que ele entra na casa dos patrões e dos empregados. Com certeza também entraria na sua casa esta noite. Ele desejava tanto um caminhãozinho! Igual àquele que puxava os trabalhadores para o eito sob sol e chuva. Há dias vinha sonhando com o presente. Nesta noite, com certeza, Papai Noel não o esqueceria.
Volta apresado à sede da fazenda e, sorrateiro, por entre tábuas, olha o presépio. Lá está o Menino Jesus, Nossa Senhora e São José com seu cajado. Ao redor, os animais. Novamente vem à cabeça: será que a caminha de fiapos de vassoura é quentinha? Será que o Menino Jesus não passará frio?
__ Acho que não - conclui, depois de alguns segundos. __ Está fazendo calor, faz dias que não chove ...
Mira o final de tarde. O sol esbraseado na aba dos morros achatados. Não há prenúncios de chuva. A noite será morna, cálida. Dá a volta ao casarão e ouve vozes dos filhos do fazendeiro. A menina diz:
__ Eu quero ganhar uma boneca que fala. Daquelas que eu vi nas revistas. Se não for igual, eu jogo fora! Já pedi pro Papai Noel. E você?
O garoto remexe um baú de madeira cheio de brinquedos, que raramente são lembrados.
__ Eu quero um robô que me obedeça! Estou cansado desses brinquedos que não se movem. parecem lesmas ...
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