Durante a década de 1920, Jean Piaget (1896-1980), epistemólogo suíço, desenvolveu juntamente com uma equipe longas pesquisas sobre o desenvolvimento moral na criança. Em 1932 publica o seu livro “O julgamento moral na criança”, já com várias edições no Brasil, neste livro Piaget sintetizará suas pesquisas e proporá uma teoria do desenvolvimento moral, esta, então, é a mais aceita ou conhecida no meio acadêmico e também leigo.
Trataremos moral e ética com conceitos diferentes, sendo que moral implica o dever e ética estudará de forma mais aprofundada as circunstâncias implicadas em uma ação e aconselhará, ou seja, a ética implica a dimensão do desejável enquanto a moral a dimensão da obrigatoriedade. Ao contrário dos estudos normativos sobre moral e ética, que pretendem responder questões como “Que vida o homem deve viver?”, “O que é felicidade?” e “Como devemos agir?” – a filosofia da moral se propõe responder isto. – a Psicologia do Desenvolvimento ao estudar a moral e ética terá como trabalho responder as seguintes perguntas: “Como o Homem torna-se um ser moral?”, “Como o Homem desenvolve a moralidade?” e/ou “Quais os processos psicológicos que fazem com que um sujeito aceite para si determinada regra, seja ela qual for, como algo desejável e o correto para uma boa conduta?”; A psicologia também estudará os processos que levam uma pessoa a ter para si deveres.
Dos autores que mais se destacam quando falamos em desenvolvimento moral são Sigmund Freud, quando descreve o funcionamento do Id, Ego e Superego, sendo o último a face moral de um indivíduo e, Jean Piaget, já falado no início. Piaget teve sua teoria do desenvolvimento moral mais disseminada e aceita, levando destaque no assunto, mesmo porque, enquanto a teoria piagetiana ocupa o campo da Psicologia do Desenvolvimento, a freudiana ocupa o campo psicanalítico.
Em seu livro “O julgamento Moral na Criança” Piaget trará um conceito de moral dizendo que esta “consiste num sistema de regras”, e dirá que “a essência de toda a moralidade deve ser procurada no respeito que o indivíduo adquire por estas regras”. Assim, ele irá a campo pesquisar como funciona a moral infantil, mas analisando as regras dos jogos que as crianças brincavam. Segundo ele não poderia analisar uma moralidade infantil, como uma moralidade adulta, e sim, observar o funcionamento padronizado de como cada criança via as regras, como uma moralidade delas, própria da sua forma de pensar, sem que houvesse uma interferência de julgamento da consciência adulta de moral.
A partir de suas observações e dos resultados das pesquisas de sua equipe, Jean Piaget dirá que o desenvolvimento moral segue fases, como fases de desenvolvimento intelectual, e estes andaram juntos. Na mudança das fases haveria assim um “salto de qualidade”, ou seja, um desenvolvimento em relação à fase anterior. Piaget dirá que esta continuidade de fases não será “linear” e apresentará uma “continuidade sem interrupções”.
Dois grupos de fenômenos serão apresentados em seu livro no que concerne às regras do jogo – lembrando que estas regras são particulares da criança, ou seja, quem sabe, o adulto não iria segui-las. – o primeiro concerne a “prática da regra”, isto é, a maneira como cada criança aplica a regra, e o segundo a “consciência da regra”, isto é, a maneira pela qual as crianças, de diferentes idades, apresentam o “caráter obrigatório, sagrado ou decisório” da regra, explicando melhor: o que a criança pensa sobre a regra. “As relações existentes entre a prática e a consciência da regra são, de fato, os que melhor permitem definir a natureza psicológica das realidades morais.”
Quando a prática da regra Piaget elabora quatro estágios sucessivos (as idades contempladas são especulações a partir das pesquisas de Piaget, sendo que variam dentro do espectro de autores e há inevitáveis variações quando observado em diversas crianças, ainda mais que os estudos de Piaget são de mais de oitenta anos atrás, atualmente as crianças são diferentes, por conta dos estímulos da cultura e da tecnologia.), estes estágios são (1) motor e individual (0-2 anos), a criança respeita apenas regras motoras e não regras propriamente coletivas; (2) estágio egocêntrico (2-5 anos), inicia-se quando a criança recebe do exterior o conjunto de regras já codificado. Ela irá, apesar de imitar as regras, não se preocupar em encontrar parceiros para o jogo, podendo jogar sozinha, e sem se preocupar em vencê-los, ou seja, neste estágio a criança ainda que jogando em grupo jogará para si (acontecerão assim momentos em que todos venceram). Por volta dos sete ou oito anos (3) aparece o estágio da cooperação, aqui cada jogador procurará vencer seus vizinhos, sendo que haverá a “necessidade de controle mútuo e da unificação das regras” (significa também que em diferentes circunstâncias haverá regras diferentes para um mesmo jogo). O quarto estágio (4) é o da codificação da regras (11/12 anos- ), aqui as regras do jogo são regulamentadas com minúcias, “até nos pormenores do procedimento”, o código de regras seguido será conhecido por toda a sociedade.
Quanto à consciência da regra Piaget declara a existência de três estágios: O primeiro é a Anomia, “a regra ainda não é coercitiva, seja por que é puramente motora”, seja porque é suportada a título de interesse e não como um dever. O segundo estágio inicia-se por volta dos cinco anos de idade, “a regra é considerada como sagrada e intangível, de origem adulta e de essência eterna (ou seja, para a criança a regra, que veio da autoridade, sempre existiu e sempre irá existir); “toda a modificação proposta é considerada pela criança como uma transgressão”. Este período é conhecido pelo termo Heteronomia, para a criança neste estágio, a regra é mais que uma lei. Enfim, no terceiro estágio, denominado Autonomia, a criança terá como regra um “consentimento mútuo, cujo respeito é obrigatório, se se deseja ser leal, permitindo-se, todavia, transformá-la, à vontade, desde que haja o consenso geral”, ou seja, a regra aqui não é mais algo intangível, e assim, pode haver certa flexibilidade no julgamento. Segundo Piaget “a regra coletiva é, inicialmente algo exterior ao indivíduo e, por conseqüência, sagrada. Depois, pouco a pouco, vai-se interiorizando e aparece, nessa mesma forma, como livre resultado do consentimento mútuo e da consciência autônoma”.
Muitas outras coisas se poderiam falar da teoria piagetiana do desenvolvimento moral infantil, conceitos como justiça, desenvolvimento afetivo, vontade, entre outros são de inteira relevância para o leitor que deseja um maior aprofundamento. Mas, meu objetivo aqui é apenas uma “degustação” e não um “banquete” do conhecimento. Logo, espero que o interesse despertado motive buscas maiores ao tema.
REFERÊNCIA:
PIAGET, Jean. O julgamento moral na criança. São Paulo: Mestre Jou, 1977.
http://alimenteocerebro.com/a-moral-na-crianca-em-piaget/
0 comentários:
Postar um comentário