NESSE DIA DE CORPUS CHRISTI, CORPO DE DEUS, ESSA CRÔNICA EM QUE FALO DA EUCARISTIA:
EUCARISTIA
José Fernandes
– No dia de Corpus Christi, recebi um email, em que se mostravam evidências da presença de Cristo na Eucaristia, ocorridas ao longo da história. Entre as várias revelações feitas, destacava-se a primeira, ocorrida no ano de 1263, em Orvieto, em que o sangue de Cristo jorrou sobre o altar. Após investigações, comprovou-se a veracidade do acontecido e instituiu-se a festa de Corpus Christi, até hoje comemorada.
– Pois é, Geraldino, a partir dessa hierofania, palavra grega que significa revelação do sagrado, muitas outras ocorreram e, mesmo assim, há quem não acredite. Recentemente, mesmo, houve uma na Coréia do Sul.
– Conceição, na mesma proporção que Deus se revela através dos ritos e dos rituais religiosos, marcadamente pela Santa Missa, os homens repetem a estultícia do bezerro de outro e outras sobejamente narradas nas Escrituras ou na história. Não sem razão, um grande filósofo do século XX dissera que a humanidade é um mal incurável. Mas, creio que a renitência apresentada por pessoas, chamadas ateias, e até por alguns cristãos, se deve à ignorância.
– Aliás, essa desgraça é responsável por cânceres inúmeros da humanidade! Um homem sem cultura é um homem cego. Vê muitas coisas; mas não as enxerga, porque enxergar implica conhecer a essência e os fundamentos necessários à crença ou à descrença. A fé, mesmo envolvendo a figura do mistério, não pode ser cega. Ela tem de se embasar na evidência, resultante da inteligência, da capacidade de discernimento. Por isso, o homem inculto pouco difere dos animais; é ente e, não, ser; existe, mas não é.
– Pois é, Geraldino, se as pessoas percebessem a energia emanada do verbo, a Eucaristia apresentar-se-lhes-ia como um resultado normal da pronúncia, porquanto palavra é sopro, é alma e espírito. Para o senhor ter uma ideia, tenho um amigo que materializa seus desejos, através do que escreve. Se ele conceber um poema, por exemplo, movido pela simpatia, ela se reverterá em bem; mas se elaborar um poema com ódio, coitada da pessoa ou da instituição por ele abominada. A palavra é um mistério que substantiva outros mistérios, outros enigmas, inclusive o de fé.
– É o que ocorre na Eucaristia. Não acreditar nela é como não acreditar que Deus é Verbo. Basta verificar que todas as mitologias possuem um deus da palavra. A Eucaristia é repetição da fala autêntica, por intermédio do rito e do ritual da Missa. São palavras que transubstanciam o pão e o vinho no corpo e no sangue de Cristo. Mesmo que eles mantenham a aparência de pão e de vinho, a partir do momento em que o sa-cerdote pronuncia a palavra, segundo o rito e o ritual, ocorre a transubstanciação, não, da matéria, mas na dimensão do prodígio, do mistério que é revelação do sublime, a máxima expressão da divindade.
– O problema, Geraldino, é que, decorrência do desconhecimento filosófico, teológico e metafísico da palavra, poucos a olham por dentro e, como consequência, são incapazes de sentir a essência e o fundamento do “dixit”. Há culturas que entendem bem a profundidade da enunciação do logos, daquele verbo de que fala São João, tanto que, ou não pronunciam determinados nomes, ou os utilizam apenas em circunstâncias específicas, mormente nos rituais religiosos. Aliás, esse costume se encontra ainda em nossa cultura popular, cristalizada no coração do todo a que também se chamam formas simples. Desde menina, vejo que as pessoas mais velhas, quando falam de algum tumor, jamais apontam para o próprio corpo. Se o fazem, dizem: “Encontra-se, lá, nele”, como a afastar o mal de si mesma! Isso mostra a crença do poder transformador da palavra.
– Conceição, eu não tenho dúvida de que à articulação do “Isto é o meu corpo” e “Este é o cálice do meu sangue” opera-se, em cada missa, aquele “faça-se” que Iavé soprou sobre o nada. O fenômeno teológico da Eucaristia, além de constituir-se artigo de fé, tem de ser entendido na dimensão do extraordinário, do sobrenatural capaz de elevar o homem ao sublime e ao divino, a ponto de igualá-lo aos deuses, mediante a criação de um poema, ou uma música, por exemplo, em que o faça-se se repete no tempo e no ritual de sua pronúncia. Evidente que, segundo nosso entendimento, falamos de arte poética e musical em sua mais funda concepção estética, como a vemos nos grandes poetas e nos grandes compositores, como um Camões ou um Beethoven; um Mallarmé ou um Rachmaninoff; um Gilberto Mendonça Teles ou um Vangelis. Pena que poucas pessoas são capazes de penetrar nos mistérios, nos enigmas e no encanto de se ser pão e corpo, vinho e sangue, mediante a substancialização efetuada por meio da palavra proferida no rito e no ritual, em que ela é sopro e pronúncia do novo no sempre. É realmente imprescindível que se ouça e se entenda o verbo para se chegar ao sublime, ao Verbo e seu prodígio! Deo gratias et Mariae! Semper Deo gratias et Mariae!
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