ORAÇÃO SEM NOME


Oração sem nome

(O autor desse poema, quem o sabe? Foi encontrado em pleno campo de batalha, no bolso de um soldado americano desconhecido; do rapaz estraçalhado por uma granada, restava apenas intacta esta folha de papel.) 

Escuta, Deus:

jamais falei contigo.

Hoje quero saudar-te. Bom dia! Como vais?

Sabes? Disseram-me que tu não existes,

e eu, tolo, acreditei que era verdade.

Nunca havia reparado a tua obra.

Ontem à noite, da trincheira rasgada por granadas,

vi teu céu estrelado

e compreendi então que me enganaram.

Não sei se apertarás a minha mão.

Vou te explicar e hás de compreender.

É engraçado: neste inferno hediondo

achei a luz para enxergar o teu rosto.

Dito isto, já não tenho muita coisa a te contar:

só que... que... tenho muito prazer em conhecer-te.

Faremos um ataque à meia-noite.

Não sinto medo.

Deus, sei que tu velas...

Há! É o clarim! Bom Deus, devo ir embora.

Gostei de ti... vou ter saudade... Quero dizer:

será cruenta a luta, bem o sabes,

e esta noite pode ser que eu vá bater-te à porta!

Muito amigos não fomos, é verdade.

Mas... sim, estou chorando!

Vês, Deus, penso que já não sou tão mau.

Bem, Deus, tenho de ir.

Sorte é coisa bem rara.

Juro, porém: já não receio a morte.

(Rose Marie Muraro e Frei Raimundo Cintra, As mais belas orações de todos os tempos)

0 comentários:

Postar um comentário