SANGUE VERDE - DAVID GONÇALVES / EM EDIÇÃO


— Ela se afina mesmo como corda de viola? — pergunta, meio assustado e admirado, Zé das Trilhas, enquanto aperta o dorso do cão.

— Artimanha dela. Espicha, encolhe, afina, engrossa, sempre com o nó do rabo numa raiz forte. Até que o boi fraqueja... Enfraquecido, mal respira. Ela, então, enlaça-o pelo pescoço, depois pela barriga e dorso. É o fim. Ela arrocha mesmo e quebra os ossos um por um. Por uns dias, ela se amoita e tem comida farta... Não se incomoda com ninguém. Ela está com a barrigona cheia. Todo mundo pode passar perto dela, até tropeçar nela que nem bola dá. 

As sombras dançam inquietas nas paredes do armazém. O velho Gabiroba sentencia:

— Ela está espreitando pelas redondezas.

Os dois homens estão ressabiados. Olham assustados o pátio escuro como se tivessem ouvido um rastejar. Pouco conversam. Está na hora de fechar as portas; pernilongos e maruins, na noite morna, estão sedentos de sangue.

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