"É COM CERTA SABEDORIA que se diz: pelos olhos se conhece uma pessoa. Bem, há olhares de todos os tipos – dos dissimulados aos da cobiça, seja pelo vil metal ou pelo sexo.
Garimpeiro se conhece pelos olhos. Olhos de febre, que flamejam e reluzem. Há, em suas pupilas, o ouro. O brilho dourado tatua a íris. Trata-se apenas de um reflexo de sua alma e daquilo que corre em suas veias. É um vírus. A princípio, um sonho distante, mas, ao correr dos dias, torna-se uma angustiante busca. Na primeira vez que o ouro fagulha na sua frente, na bateia, toda a alma se contamina e o vírus se transforma em doença incurável.
Todos, no garimpo, têm histórias semelhantes. Têm família, filhos, empregos em suas cidades, nos distantes Estados, mas, de repente, espalha-se a notícia do ouro. Então, largam tudo, vendem a roupa do corpo e lá se vão. Caçar o rastro do ouro é a sina. Nos olhos, a febre – um brilho dourado doentio. Sim, é fácil conhecer um garimpeiro...
Todos sabem que, no garimpo, não é lugar para se viver. Mas ninguém abandona o seu posto. Suor, lama, pedregulhos, pepitas douradas, cansaço – é a vida que até o diabo rejeita.
Por onde passam, o rastro da destruição. A Amazônia é nossa. Tratores e retro-escavadeiras derrubam e limpam a floresta; as dragas chegam, os rios se contaminam rapidamente de mercúrio. Quem pode mais, chora menos. Na trilha do brilho dourado, nada se preserva. Ai daqueles que levantarem alguma voz... No dia seguinte, o corpo é encontrado no meio da selva, um bom prato aos bichos.
Tal lugar tem ouro – a notícia se espalha. De planícies e montanhas, mar e sertão, de Norte a Sul, Leste a Oeste, mais de dez mil almas atendem ao chamado. Surgem do nada, como mágica: de barco, ônibus, avião, moto, calhambeques estropiados, até a pé. Mas atendem ao chamado. De repente, a floresta se transforma em um formigueiro. E lá se vai a Amazônia..."
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