"...
Os capangas bateram esporas, botas pairaram no ar. Por um momento, a terra tremeu. As esporas rodaram suspensas, trim-tlinn, trim-tlinn!, o coração da peonada, que fazia a grande cerca campo afora, parou como uma máquina enferrujada. Os que estendiam os rolos de arame farpado retesaram os músculos; os que fincavam os mourões pararam amedrontados. A voz alterada de Bambico se ouvia a quilômetros, fazendo os répteis se refugiarem em tocas. A faina diária prossegue suspensa, pejada de enigmas carregando a servidão nos costados. A figura de Bambico enche o pátio. O rei carrasco. Os cachorros, seus guardas. A carranca de rugas pula endemoniada sobre as artérias feito lagarto dissecado. O bigode trêmulo equilibra suspenso a cabeça quadrada outonal.
Os capangas estão voltando, trazem o boi malandro aos socavões. Não é boi, não: é Jovino suando frio no arrastão. Está fraco, mais parece um saco velho de estopa. Não há lágrimas em seus olhos. A cabeça está oca, uma cabaça seca. Alguém enfiara as mãos nela e retirara os miolos. A roupa de brim grosso já é trapo.
— Safado se trata com chicote de couro cru ou achava que, nesta fazenda, não há lei alguma? Pois saiba: eu sou a lei!
Os cachorrões esticam as orelhas; a voz embrutecida de Bambico se perde campo afora. Está vermelho, as artérias ameaçam explodir. Saliva tanto quanto os seus cachorros de raça.
— Perdeu a língua? Fala, bicho ladrão!"
Mexem as patas os cachorros, cada vez mais inquietos. Eles também querem avançar sobre Jovino. Esperam por um sinal.
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